Em maio deste ano, um foguete lançado pela SpaceX, empresa fundada por Elon Musk, carregou uma carga útil que anuncia grandes oportunidades para os negócios globais. No topo do foguete havia 60 satélites para conexão com a Internet, empilhados como panquecas, representando o início de uma ambiciosa rede chamada Starlink. A SpaceX planeja lançar cerca de 12 mil satélites nos próximos anos a fim de fornecer serviços de banda larga em todo o planeta.
Desde que a World Wide Web foi popularizada com o lançamento do navegador Mosaic há 26 anos, apenas cerca da metade da população global tem obtido acesso à Internet. De acordo com o relatório das Nações Unidas, o Estado da Banda Larga, 49,2% das pessoas estavam on-line até final de 2018 com acesso confiável e financeiramente viável. As regiões variam enormemente: Europa está 80% on-line, África apenas 22%.
A maioria das regiões ainda não cobertas é rural e de baixa renda. Em geral o acesso é extremamente caro para a instalação de fibra ótica (ou qualquer tipo de cabo) nessas áreas. A cobertura por torre de celular é menos cara, mas requer uma massa crítica de clientes pagantes para viabilizar o aspecto econômico.
As empresas de tecnologia que se beneficiam com a expansão da Internet reconhecem essa questão. Na década passada, muitas começaram a experimentar saltos de inovações para fornecer uma cobertura de Internet mais ampla.
A tecnologia com maior probabilidade de revolucionar a extensão da banda larga, de forma mais ampla, satélites do tipo low-earth-orbit (LEO), está atualmente sendo desenvolvida e empregada por várias empresas. Além da SpaceX, a Amazon anunciou planos de lançar mais de 3 mil satélites do tipo LEO. A OneWeb, uma empresa apoiada por SoftBank, Richard Branson e outros, também começou a preparar e empregar uma rede de mais de 600 satélites. Os novos satélites têm por meta ser mais rápidos, menores e mais potentes que os modelos anteriores, oferecendo períodos de latência de Internet de 25-35 milissegundos — iguais ou melhores que muitos sistemas de cabos e DSL.
Outras empresas estão buscando expandir a banda larga via diferentes tecnologias. A Google está fazendo experimentos com balões em grandes altitudes que atuam como torres de celulares flutuantes, e a Facebook está investigando drones impulsionados por energia solar produzidos pela Airbus e outras.
Balões brancos, drones, e especialmente satélites, estão prometendo soluções ao problema de acesso à Internet no mundo, mas ainda permanecem sem testes em larga escala. Quando, então, os novos mercados terão acesso de alta qualidade e acessível à banda larga?
Provavelmente muito em breve. A SpaceX, que está atualmente liderando a corrida com os satélites LEO, planeja lançar algo em torno de 800 deles até o final de 2020, um número que ela alega apoiará uma constelação comercialmente viável. A OneWeb visa uma rede comercialmente viável até 2021. O cronograma da Amazon não é claro, mas com base nos recursos da empresa, além de seu acesso aos recursos de lançamento através da Blue Origin de Jeff Bezos, é provável que ela se torne um participante importante. Finalmente, a iniciativa da Google, Loon, assinou um contrato com seu primeiro cliente comercial, Telkom Kenya, para prover para áreas rurais da África. Os serviços estão ainda este ano.
De forma geral, é razoável prever que, nos próximos três a cinco anos, grande parte do planeta terá algum acesso à banda larga confiável, ainda que um pouco cara. Isso significa que mais de três bilhões de pessoas estarão, pela primeira vez, conectadas diretamente à economia global. Os primeiros a adotar o sistema – empresas, agências governamentais, escolas, clínicas médicas – serão consumidores ansiosos, mesmo enquanto os preços estiverem altos. A redução de custos provavelmente permitirá um acesso mais amplo às populações restantes não conectadas nos próximos anos através de smartphones e outros dispositivos.
A comunidade empresarial deve considerar este mercado emergente com espanto, senão por outro motivo, mas pelo seu vasto tamanho. Este fato apresentará dificuldades em termos de economia, geografia, idioma e demografia. No entanto, as empresas que estão cientes das mudanças que estão por vir, que apreciam a velocidade e o alcance da expansão global da banda larga e que se preparam adequadamente para novos mercados, desfrutarão de várias oportunidades sem precedentes. Especificamente, os negócios deverão se preparar em quatro áreas.
Populações diferentes
Grande parte dos bilhões de consumidores que estarão on-line serão. Muitos terão acesso limitado à educação. Alguns podem não estar familiarizados com produtos e serviços que estão amplamente disponíveis em outras regiões. Para atender a essas novas populações, os produtos e serviços oferecidos pela Internet precisam ter designs acessíveis e intuitivos, ou incluir instruções claras para o uso inicial.
A comunicação também precisará ser regionalizada. Metade das pessoas do planeta fala um dos cinco principais idiomas (mandarim, espanhol, inglês, árabe e hindi). Contudo, bilhões de pessoas que terão acesso on-line podem falar um dos mil idiomas. As comunicações precisarão ser conduzidas por parceiros locais que adicionem consciência cultural e habilidades linguísticas.
Modelos de negócio
Como muitos novos consumidores estarão localizados em países de baixa renda e terão recursos limitados, os modelos de negócio terão de ser adaptados às suas necessidades. Em muitos casos, um modelo de “prestação”, no qual os consumidores pagam um pouco por mês com contas on-line, pode ser eficaz, como foi demonstrado com produtos que variam de telefones celulares a apólices de seguro de vida. Por exemplo, muitas empresas tentaram, sem sucesso, vender sistemas solares domésticos em economias emergentes. Porém, quando a M-KOPA Solar vinculou o faturamento às contas de celular dos usuários (e desligou remotamente os sistemas solares quando as contas não eram pagas), as vendas decolaram.
Pode também haver oportunidades para modelos de negócio híbridos envolvendo parcerias públicas e filantrópicas. Na realidade, o Banco Mundial pretende bilhões em projetos de energia renovável em economias emergentes até 2025 — uma iniciativa que resultará em oportunidades significativas no setor privado.
Estratégia de plataforma
Se a experiência passada se mantiver verdadeira, os novos mercados que entrarem on-line serão rapidamente dominados por um pequeno número de plataformas globais, especialmente o Facebook. Em muitos mercados o Facebook é oferecido gratuitamente (com dados subsidiados pela Facebook ou empresas de telecomunicações); portanto, a adesão é rápida. Geralmente os consumidores não estão cientes de que existem outros serviços e recursos on-line fora do Facebook. Uma pesquisa em 2015indicou que 65% de nigerianos, 61% de indonésios e 58% de indianos concordaram com a afirmação “Facebook é a Internet”. (Apenas 5% de americanos concordaram).
A Facebook também detém o WhatsApp, o serviço de mensagens dominante em muitos países de baixa renda, bem como o Instagram, que também tem um grande perfil internacional. Devido ao domínio do Facebook em novos mercados, todas as empresas que consideram a expansão nessas áreas precisam levar em consideração sua estatura. Em algumas regiões, isso pode significar, por exemplo, abandonar planos para comunicações separadas em páginas da web e usar o Facebook para obter informações, comunicações e transações da empresa.
Comunicações de áudio e vídeo
Uma ampla parcela das populações que ganham acesso à Internet pode ser analfabeta. A comunicação pode ser dificultada visto que muitas pessoas falarão idiomas regionais, o que significa que as comunicações em áudio e vídeo serão bem eficientes. Isso já pode ser visto com as tecnologias de alto-falante inteligente, como Alexa e Google Assistant, que se tornaram mais prevalentes nos mercados internacionais. O Alexa oferecido na Índia, por exemplo, já fala em hindi, kannada, tamil, telugu e malaio, e conhece receitas biryani, enredos de filmes de Bollywood e piadas de cricket. Os alto-falantes também são menos caros que os smartphones e é possível imaginar brindes gratuitos no futuro, assim como os smartphones simples agora são oferecidos gratuitamente na Índia.
Enquanto o próximo bilhão de consumidores entrar on-line através de smartphones, os outros provavelmente entrarão on-line via alto-falantes inteligentes culturalmente adaptados. As empresas que buscam se expandir nos países em desenvolvimento devem começar a experimentar a criação de “habilidades” de alto-falante inteligente (como aplicativos), pois elas terão um papel importante nos mercados futuros.
Em resumo, a expansão global da banda larga representa uma oportunidade que não pode ser ignorada. Os bilhões de consumidores que entrarão on-line nos próximos anos representam uma expansão única na história do mercado global. As empresas que reconhecerem a velocidade e magnitude dessa transformação e se educarem sobre como reagir a ela estarão mais bem posicionadas para aproveitar as oportunidades sem precedentes.
Jim Cashel é presidente da Forum One, uma agência digital, e autor do The great connecting: the emergence of global broadband, and how that changes everything. Durante o ano acadêmico de 2018-19, Cashel foi Bolsista Visitante da Harvard Kennedy School.
Fonte: Artigo publicado na Harvard Business Review