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Três coisas que você está errando na mudança organizacional

Nadya Zhexembayeva

Ao longo dos últimos anos, realizamos um levantamento sobre “mudança” com os nossos clientes. Em 2018, dos mais de 2 mil gestores que participaram, 47% afirmaram que, para sobreviver, precisaram reinventar seus negócios a cada três anos ou menos. Dados do ano de 2020 ainda estão sendo coletados, mas os primeiros 500 participantes mostram que o número subiu para 58%.

Isso não deveria ser uma surpresa, dadas as profundas interconexões que surgem com a participação em uma economia global. O Relatório Global de Riscos de 2019 do Fórum Econômico Mundial mapeou 30 riscos críticos em cinco categorias – econômicos, ambientais, geopolíticos, sociais e tecnológicos – e mostrou as interconexões entre eles. A disseminação de uma doença infecciosa estava entre os dez riscos mais críticos. A Covid-19 (ou algo parecido com ela) foi absolutamente prevista; quaisquer outras interferências previstas provavelmente também acontecerão.

O problema é que, embora reconheçamos e até possamos prever os riscos, não conseguimos nos adaptar a eles. Há 20 anos, em um artigo dessa mesma edição, Nitin Nohria e Michael Beer observaram que “cerca de 70% das iniciativas de mudança não deram certo”. Atualmente, segundo a BCG, empresa global de consultoria, nós pioramos esse índice: “75% dos esforços em transformação não apresentam os resultados esperados”.

Sendo assim, há uma preocupação de que as empresas não permaneçam bem-sucedidas por muito tempo. A Previsão da Longevidade Corporativa de 2018 realizada pela Innosight mostrou que, em 1964, as 500 empresas listadas no S&P permaneceriam nela por uma média de 33 anos. Em 2016, este número caiu para 24 anos e é previsto que ainda diminua para 12 até 2027,”

Isto sugere que há algo de muito errado com algumas de nossas premissas básicas com relação ao que funciona na mudança. A minha própria experiência ao trabalhar com clientes sugere que muitos de nossos fracassos em mudança advêm de nossas três premissas muito básicas e enraizadas, sobre o que funciona. É ao trocar essas premissas que conseguiremos resultados.

Troca #1

De: Siga as melhores práticas

Para: Fale sobre seus fracassos

A gestão moderna sempre deu valor às “melhores práticas”. Até mesmo em salas de aula e salas de Conselho, os gestores lançam mão das referências e exemplos para conduzir e nortear as mudanças. Adiante, uma nova pesquisa apresenta uma maneira melhor.

Cientistas da Kellogg School of Management, nos EUA, realizaram uma série de experimentos para verificar qual tipo de aquecimento levaria a uma sessão de troca de ideias melhor e mais produtiva. Em um desses experimentos, os gestores formaram pequenos grupos para criar usos atípicos para uma caixa de papelão. No entanto, antes da troca de ideias, a metade dos grupos recebeu instruções para falar sobre uma situação constrangedora pela qual passou nos últimos seis meses, e a outra metade recebeu instruções para falar de uma situação que lhes deu orgulho. “Os resultados foram nítidos: as equipes que contaram histórias constrangedoras geraram 26 por cento mais ideias do que os grupos que falaram sobre as situações que lhes deram orgulho… As equipes que compartilharam histórias constrangedoras também geraram uma variedade maior de ideias, abrangendo 15 por cento mais de outras categorias.”

Além de aumentar a criatividade, falar sobre os fracassos também fortalece uma equipe. Em seu artigo clássico de 1988, o professor Abraham Tesser mostra que observar os outros terem um desempenho melhor do que o nosso, em geral, ameaça a nossa autoestima, ao passo que a vulnerabilidade visível demonstrada pelas pessoas que contaram histórias constrangedoras sobre elas ajuda numa melhor conectividade.

Portanto, se uma ruptura atingir você e você estiver tentando obter novas ideias para ajudar sua empresa a se adaptar a essa mudança, comece com um aquecimento “constrangedor” antes da próxima reunião – para que ambas quantidade e qualidade das ideias sejam melhores e as conexões dentro da equipe se fortaleçam.

Alguns meses atrás, fiz esse aquecimento com um grupo de executivos seniores de produção e, mesmo dentro do contexto científico, houve uma pausa desconfortável antes de a primeira pessoa começar a falar. Contudo, uma vez que “quebramos o gelo”, a sensação de alívio coletivo ficou palpável. Repentinamente, não mais precisávamos nos portar da melhor maneira possível para tentar impressionar ou competir. Na verdade, conseguimos explorar territórios desconhecidos – e nos divertir um pouco durante a atividade.

Troca #2

De: Se não está quebrado, não conserte.

Para: Conserte mesmo assim

Há tempos, a resistência a mudanças vem sendo citada como uma das principais razões pela qual as empresas não conseguem se adaptar na hora certa; já falei sobre a pesquisa que confirma que poucos funcionários estão preparados para assumir os riscos necessários para se reinventar (entre 11% e 19%) – principalmente quando a necessidade de mudança não está aparente de imediato.

Então, o que podemos fazer?

A técnica testada é o planejamento de cenário e o plano de contingência – mas seu uso diminuiu significativamente nos últimos anos, de 65% das empresas utilizando-a em 2011, para somente 19% em 2018. É provável que o problema seja o de uma enorme empreitada. Em geral, meus alunos de educação executiva me pedem uma versão mais simples e mais acessível de um planejamento de cenário – algo que não fosse tão parecido com um exercício do tipo regime militar hierárquico – de cima para baixo – mas como uma exploração mais engajadora e aberta, de baixo para cima, que pudesse transformar até os mais ativos céticos em mudanças.

Uma abordagem que pode servir é o exercício “Mate a empresa”. Convide um grupo de funcionários (e, de vez em quando, envolva fornecedores, clientes, e alunos jovens), divida-os em grupos e peça para que façam um brainstorming sobre as maneiras mais eficazes e eficientes de matar a própria empresa que os convidou.

Ao final do dia de “matar a empresa”, a variedade de ideias de como matá-la (e salvá-la) é somente equiparada à disposição das pessoas em mudar, para evitar o infeliz destino. Lisa Bodell afirmou que “a primeira vez que a HBO fez este exercício, foram geradas três páginas de táticas que um concorrente poderia lançar mão para destruir a rede. Uma mineradora americana realiza esse exercício com frequência para se proteger tanto dos concorrentes como das forças de mercado. Uma Câmara Municipal no estado Texas chegou a dar um novo propósito ao exercício, nomeando-o de “Mate a Comunidade” para identificar e resolver ameaças de grandes proporções à cidade.”

Troca #3:

De: Controle Seus Bens

Para: Divida Seus Bens

Em geral, as firmas têm ou arrendam recursos que utilizam para criar valor, frequentemente travando o capital do patrimônio que não utilizam o tempo todo. Isso vale para as empresas que operam no mercado B2B. O problema é que, em épocas mais voláteis, eles sentem a falta de dinheiro em caixa, o que os faz compartilhar um bem.

A ideia de compartilhar algo sem muita utilização tem sido prática comum há certo tempo – e vem gerando alguns negócios bem-sucedidos, desde a Airbnb à BlaBlaCar, fazendo com que pessoas ganhem dinheiro a partir dos bens que não utilizam sempre. Um exemplo mais recente é a TULU, que ajuda as pessoas que moram em condomínios a compartilhar utensílios domésticos (como batedeiras da KitchenAid, aspiradores de pó e colchões) nas dependências do condomínio.

Não há dúvidas de que as empresas também têm recursos que não estão sendo utilizados; sendo assim, por que não os compartilhar com outras empresas – até mesmo concorrentes – e economizar um pouco, diminuir sua pegada ecológica e aumentar a flexibilidade no processo?

Foi exatamente isso que a Werflink, na Bélgica, fez; construiu uma plataforma pública de compartilhamento de bens móveis para o setor da construção civil. A V-Industry, na Alemanha, se concentra no compartilhamento de bens móveis manufaturados – permitindo que qualquer pessoa adentre as instalações de produção não utilizadas facilmente. O compartilhamento de bens móveis pode começar a partir de um pequeno empenho interno: a WinWin é uma plataforma de compartilhamento de bens móveis criada pelo Albert Schweitzer Hospital, na Holanda, que possibilita o compartilhamento de equipamentos, das instalações e de funcionários entre os diferentes departamentos do hospital. Não é difícil imaginar que isso possa abranger outros hospitais também.

Seja por meio de um “aquecimento via constrangimento”, seja pela exploração de uma ideia mais complexa de compartilhamento de bens, uma coisa está clara: para sobreviver e prosperar em um mundo arriscado, interligado de fluxo constante, é preciso fazer das adaptações parte da rotina. Este não é um projeto que se realiza somente uma vez, como construir uma casa para sempre. Tem muito mais a ver com uma criança que não para de crescer; seu corpo e a forma como seu cérebro funciona mudam a cada ano que passa. Em meu livro, permanecer no estado perpétuo de abertura infantil, crescimento e renovação parece ser exatamente o que precisamos neste momento.

Fonte: Portal da Harvard Business Review – Nadya Zhexembayeva é ex-professora titular de desenvolvimento sustentável da Coca-Cola na IEDC-Bled School of Management, centro de educação executiva na Eslovênia, e Chief Reinvention Officer da WE EXIST Reinvention Agency, uma empresa de consultoria com sede nos EUA.